Relação entre ARMY e BTS em tempos de pandemia

Gabrielle Guimarães
8 min readSep 5, 2021

A pandemia em virtude da COVID 19 continua sendo um assunto — infelizmente — recorrente no momento em que esse texto está sendo publicado, e talvez seja responsável pela maioria das mudanças ocorridas há pelo menos um ano. A matéria feita pela BBC¹ sobre o impacto emocional durante esse período afirma que 45% dos 21 mil entrevistados declararam que sua saúde mental piorou um pouco ou muito no último ano, e que esse é um problema global.

A Teoria da Escolha, de William Glasser, diz que agimos da maneira que aumentamos o prazer e diminuímos a dor, queremos — e devemos — nos comportar do jeito que nos faça sentir melhor. Por isso, qualquer comportamento que satisfaça nossas necessidades: sobrevivência, amor, pertencimento, liberdade, poder e diversão é prazeroso e o contrário é sofrimento. O autor afirma que é apenas por meio das nossas relações que podemos satisfazer nossas necessidades, sendo assim é importante ponderar nossas escolhas para nosso próprio bem estar mental (COLLINS et al., 2016).

Relacionando os dois eventos: impacto da saúde mental versus nossas relações, associaremos nesse texto a influência positiva das interações e conexões entre os ARMYs e o BTS, e demonstraremos através de conceitos psicológicos como essa relação entre fã e Idol é significativa para a vivência do indivíduo, principalmente no período em que o isolamento social é uma medida de segurança.

Quando se trata da relação entre BTS e ARMY, sabemos que muitas coisas levam a estreitar o vínculo entre nós e eles. Nos sentimos próximos deles através de suas músicas, shows e lives, e até mesmo através de suas atitudes em frente a questões sociais.

Segundo Elberse e Woodham (2020), o grupo surgiu quando Bang Si Hyuk, o fundador da Big Hit Entertainment e atual CEO da HYBE, este tentava se reerguer depois de tentativas pouco sucedidas de gerenciar artistas. Desse modo, o grupo BTS veio inovando diversos padrões da indústria do Kpop.

Um desses padrões inclui a forma como os idols interagem com seus fãs. As autoras citadas acima dizem que levou um tempo para que o grupo soubesse como se comunicar melhor com o fandom. Mas, graças a plataformas como o Fancafe e, atualmente, o Weverse, o distanciamento entre fã e artista foi rompido.

Então, mesmo antes da pandemia, o Bangtan já desenvolvia uma comunicação horizontal conosco por meios digitais. Em “Seguindo o Pied Piper: As Reflexões sobre o contexto estudantil levantadas pelo BTS”, mencionamos sobre o conceito de rizoma (DELEUZE; GUATTARI, 1995) e como o fandom ARMY se organiza como uma rizoma, em que todos estão no mesmo nível. Essa quebra de hierarquias começa com o próprio grupo, o qual co-existe e compartilha experiências com a gente, por isso, como dito, nossa relação com eles tem laços estreitos. Esta relação recíproca é uma das explicações encontradas para tantas conquistas do BTS e nossas.

Como muitos fãs estão, de fato, conectados com os meninos, vê-los por telas de celular ou computador é costumeiro. Dessa forma, apesar da tristeza de não poder vê-los na Map Of The Soul Tour, nem eles e nem o fandom deixaram um ao outro desamparado.

“Não tenho religião, mas agradeço a Deus por vivermos em 2020. Agradeço a Deus por termos essa tecnologia para que possamos estar conectados sem latência e ver o rosto um do outro, literalmente, você está aqui. Parece que você está aqui.” — Namjoon na Map Of The Soul ON:E

Apesar do uso de meios tecnológicos serem uma das principais fontes de interação entre o BTS e os fãs, foi impossível não sentir o impacto da pandemia que obrigou o mundo a se isolar. A turnê foi cancelada e os meninos não puderam encontrar pessoalmente o ARMY. Diversas vezes os membros falaram o quanto é importante para eles estar em shows com os fãs e, por isso, se sentiram frustrados durante a pandemia que tirou essa possibilidade deles e do fandom. O mais recente álbum, BE, foi inteiramente trabalhado durante esse período e para essa situação. A música ‘Fly To My Room descreve o que os membros sentiram ao se depararem com esses acontecimentos:

“Todos os dias
É tão sufocante que estou enlouquecendo
Ainda parece o primeiro dia
Alguém, por favor, reinicie o relógio
O ano inteiro foi roubado de mim”
- Fly To My Room (BTS, 2020)

Diante da necessidade de uma mudança da qual não tínhamos controle, o BTS não só buscou meios de se aproximar do ARMY, mesmo que através da tela de um smartphone, como também buscou formas de trazer consolo e mostrar que é possível nos conectarmos e fortalecermos o vínculo entre fã e idol até mesmo em meio a uma pandemia. As músicas ‘Staye ‘Telepathydo álbum BE são voltadas também para esse desejo que eles têm de nos ver novamente. Na primeira, eles citam o 7G como uma referência aos sete membros, já que redes de dados móveis que existem, no momento, são até o 5G, e talvez essa tenha sido a maneira de dizer que os membros estarão conectados ao ARMY independente das circunstâncias.

Na Psicoterapia Analítico-Funcional, Kohlenberg e Tsai (2006) afirmam que relacionamentos genuínos e sensíveis geram experiências intensas e profundas. O grupo usa o lirismo na composição musical como um meio para “criar” uma nova rede de dados móveis exclusiva com o fandom no contexto pandêmico e, ao mesmo tempo, tornarem-se ainda mais autênticos, o que gera respostas positivas de engajamento e cuidado entre fãs.

Stay é uma música divertida, mas emocional, que retrata a mensagem de que mesmo que nós (BTS e ARMY) estejamos distantes, estamos sempre juntos.” Disse Jungkook, na Conferência global de lançamento do BE.

“Agora estou pensando em você
Onde quer que você esteja
Nós nos conectamos pelo 7G”
- Stay (BTS, 2020)

No artigo “BTS & ARMY, We Walk Together” da Weverse Magazine, a LP do Big Hit Three Sixty’s Artist Content Studio, Kim Su-lin, falou que o BTS buscou meios para mostrar o seu dia a dia ao fandom e que estavam buscando formas de lidar com a pandemia assim como o ARMY:

“A interrupção causada pelo surto do vírus pode facilmente fazer com que fãs e artistas se sintam impotentes. É por isso que o BTS seguiu tendências como fazer o café Dalgona no V LIVE para mostrar que seu dia a dia não é tão diferente do de seus fãs.” Ela, então, descreveu o estilo do conteúdo do BTS como: “Quando os membros ficam na frente da câmera, eles agem como normalmente fazem. Assim, quando fazemos esse tipo de conteúdo, você pode ver o verdadeiro eu dos membros.” (WEVERSE MAGAZINE, 2020)

Dessa forma, presenciamos momentos da rotina de cada membro, fomos consolados por eles e ao mesmo tempo levamos consolo a eles, compartilhando da mesma esperança de em breve nos encontrarmos pessoalmente.

Podemos dizer que isso acontece por causa da intimidade estabelecida entre o BTS e ARMY. Por intimidade, Vandenberghe (2007) entende que é o compartilhamento do que está no interior, mostrando-se ao outro sem medo de ser rejeitado. A intimidade surge quando envolve confiança e é desenvolvida através da abertura, carinho e compreensão.

Para haver intimidade, precisa haver vulnerabilidade e compaixão. Brown (2016) afirma que essas duas práticas envolvem uma relação entre iguais e o reconhecimento da humanidade em si e no outro.

Durante o Dear Class of 2020 e a 75a Assembleia Geral da ONU, dois dos muitos eventos online em que o BTS esteve presente, eles nos mostraram como estar aberto a relações e ser compassivo podem nos levar mais longe, contando seus sentimentos e memórias para milhares de pessoas. Faz-nos refletir quanta coragem é necessária para fazer isso, e talvez seja por esse motivo que o BTS nos ensina, de certa forma, a desenvolver a empatia, necessária também para nos conectarmos a eles.

“Lembrem-se de que há alguém aqui na Coréia, na cidade de Seoul, que entende vocês.” — Jimin no Dear Class of 2020

Empatia é uma das habilidades mais mencionadas nas redes sociais atualmente, junto com resiliência. É uma das causas de nos identificarmos com os integrantes, com o que transmitem nas canções e formamos vínculos entre si. É uma razão, ainda, pela qual “felizmente, entre eu e você, nada mudou”, como diz ‘Life Goes On.

Pode ser que falemos idiomas diferentes, nossas rotinas sejam distintas e que estejamos sofrendo de muitas formas com a pandemia, contudo, graças ao Bangtan, podemos ver a primavera chegando.

Texto também publicado no B-Armys Acadêmicas
Co-autoria:
Alicia Mesquita
Revisão por: Rafaela Silva

Referências

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Gabrielle Guimarães

23 anos, psicóloga, escritora e fã de cultura asiática.